Organizações divulgaram notas com críticas à MP 1157; ações de empresas na B3 voltaram a cair
Camila Souza Ramos
A publicação da MP 1.157, que prorrogou por 60 dias a desoneração de todos os combustíveis sem uma compensação tributária, gerou incômodo entre produtores de etanol. Ontem, organizações que representam o segmento divulgaram notas com ataques à decisão do governo Lula, embora a maioria não tenha criticado o governo Bolsonaro quando a medida foi adotada.
A prorrogação pegou as usinas de surpresa, já que o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, disse na semana passada que pedira ao governo anterior que não tomasse decisões com impacto fiscal para a nova gestão. A mudança de ideia de Lula sobre a tributação dos combustíveis veio no fim da sexta-feira passada.
A União das Indústrias de Cana-de-Açúcar (Unica) e o Fórum Nacional Sucroenergético (FNS), que representam a maior parte das usinas sucroenergéticas do país, emitiram nota conjunta em que citaram nominalmente o “governo Lula” como “cúmplice de um atentado econômico, ambiental, social e jurídico” por “manter a isenção de tributos federais sobre a gasolina, inaugurada pelo governo Bolsonaro”.
Já a União Nacional do Etanol de Milho (Unem) divulgou nota afirmando que, com a prorrogação, o governo federal gera “prejuízo para a cadeia produtiva do etanol de milho”, além de enfraquecer “a política nacional de incentivo aos biocombustíveis, a transição energética e a descarbonização das fontes energética de mobilidade”.
A prorrogação afeta mais diretamente as usinas de etanol de milho – que, diferentemente das de etanol de cana, não estão em entressafra e têm que produzir continuamente.
No ano passado, Bolsonaro tomou várias decisões que impactaram negativamente o etanol hidratado nacional. O hidratado encerrou o ano passado com queda de participação no mercado de ciclo Otto.
A primeira medida, de março, foi a retirada do imposto de importação de etanol até o fim do ano. Outra, de maio, foi a redução das alíquotas de ICMS dos Estados sobre combustíveis, o que diminuiu o diferencial que a gasolina e o etanol tinham em várias unidades federativas. Nas duas ocasiões, apenas a Unem divulgou críticas às decisões.
Em junho passado, Bolsonaro isentou todos os combustíveis de PIS/Cofins e Cide de forma linear, às vésperas da eleição, o que eliminou o diferencial tributário que dava vantagem ao etanol hidratado. Na ocasião, nenhuma organização do setor divulgou nota comentando.
Para evitar mais perdas, parlamentares ligados às usinas propuseram uma emenda constitucional para garantir o diferencial tributário por 20 anos, e um crédito presumido de ICMS como compensação enquanto durasse a desoneração linear de 2022.
Uma liderança do segmento que preferiu não se identificar disse que não houve críticas públicas quando a desoneração foi adotada porque à proposta foi apensada a PEC dos benefícios sociais, que “desviou a discussão”, e também porque o crédito tributário gerou uma compensação equivalente à perda que as usinas tiveram com o preço do etanol, de R$ 0,45 o litro.
Porém, executivos do ramo dizem que o crédito pouco serviu até agora, já que as usinas passaram a priorizar a produção e a exportação de açúcar, que já têm isenção tributária. Agora, com a publicação da MP por Lula, as lideranças dos usineiros reivindicam o dispositivo constitucional aprovado no ano passado, que obriga a gasolina a ter uma tributação mais elevada que o etanol.
O BTG Pactual divulgou relatório afirmando que planeja revisar sua recomendação para as ações de empresas sucroalcooleiras. Nos últimos meses, o banco manteve recomendação de compra de Raízen, São Martinho e Jalles Machado, apesar das mudanças tributárias. Entre maio, quando Bolsonaro iniciou as reduções tributárias, e o fim de 2022, as ações das três empresas tiveram forte queda na B3. Ontem, a Raízen caiu 5,35%, a São Martinho, 11,39%, e a Jalles, 7,07%.