Revista Plant Project, edição nº37
Um evento para a história. Foi essa a percepção generalizada entre os participantes da 16ª Citi Iso Datagro New York Sugar & Ethanol Conference, realizada em 4 de maio. Com a presença de pelo menos 420 convidados, foi a maior edição do evento que reuniu, uma vez mais, os principais tomadores de decisão do setor sucroenergético mundial, entre produtores, executivos, dirigentes setoriais, acadêmicos e autoridades.
Reconhecido como o evento técnico oficial do New York Sugar Dinner, o Citi Iso Datagro 2023 abordou os mais relevantes assuntos da agenda do segmento em nível global – dos desafios e oportunidades do consumo de açúcar, passando pelo papel central dos biocombustíveis no processo de descarbonização, até as perspectivas de desenvolvimento do hidrogênio verde a partir de base agrícola.
Com a presença do presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira, o Citi Isso Datagro reafirmou a importância do diálogo entre o setor público e o privado para a promoção e o desenvolvimento da cadeia produtiva sucroenergética.
Além de Lira, destaca-se também a participação de Arnaldo Jardim, deputado federal e presidente da Frente Parlamentar do Setor Sucroenergético; Pedro Robério de Melo Nogueira, vice-presidente da NovaBio e do Conselho Temático da Agroindústria (Coagro) da Confederação Nacional da Indústria (CNI); Adalnio Senna Ganem, cônsul-geral do Brasil em Nova York; Zé Vitor, deputado federal; Guilherme Nastari, diretor da Datagro; e Mário Campos Filho, presidente do Fórum Nacional Sucroenergético (agora denominado Bioenergia Brasil) e do Siamig.
PARA CITI, CENÁRIO DAS COMMODITIES É FAVORÁVEL
Na abertura do evento, o economista-chefe do Citi para a América Latina, Ernesto Revilla, discorreu sobre as perspectivas econômicas da região. Segundo ele, mesmo em um cenário global de incertezas, em um contexto de inflação elevada e aperto monetário, a conjuntura de preços das commodities permanece favorável para os países latinos.
Em relação ao Brasil, o Citi prevê crescimento do PIB de 0,3% em 2023, contra 2,9% em 2022. Por sua vez, a estimativa é de avanço de 1,5% em 2024. Para o México, segunda maior economia da região, a previsão é de alta de 1,9% no PIB deste ano, contra 3,1% de 2022.
Para 2024, o Citi projeta incremento de 1,5%. No que diz respeito ao câmbio, Revilla acredita em taxas estáveis ao longo do ano contra o dólar, com exceção do peso argentino. Estima-se que o PIB da Argentina registre queda de 4,2% em 2023, com uma taxa de inflação anual próxima a 120%.
DATAGRO PROJETA SAFRA DE CANA 2023/24 DO CENTRO-SUL DO BRASIL EM 598,50 MILHÕES DE TONELADAS
As estimativas da Datagro para a safra de cana 2023/24 foram divulgadas na 16ª Citi Isso Datagro New York Sugar & Ethanol Conference. A safra 2023/24 de cana do Centro-Sul do Brasil é projetada pela Datagro em 598,50 milhões de toneladas, o que representaria uma alta de 9,2% ante a temporada anterior, com um mix açucareiro de 48,2%.
Em relação à produção de açúcar, estima-se 38,30 milhões de toneladas para a região. Se a previsão se confirmar, significaria um crescimento de 13,6% ante o ciclo passado. A produção de etanol é prevista em 30,71 bilhões de litros, incluindo o biocombustível a partir do milho, com um aumento de 6,2% ante 2022/23. Segundo a Datagro, a produção deverá ser dividida em 11,70 bilhões de litros de anidro (-4,8%) e 19,01 bilhões de litros de hidratado (+14,4%).
Para o Norte e Nordeste, a Datagro projeta 58 milhões de toneladas de cana na safra 2023/24, volume similar ao da colheita de 2022/23, com mix açucareiro de 46,3%. A produção de açúcar está prevista em 3,20 milhões de toneladas e a de etanol, em 2,27 bilhões, ambas com alta de 2,4%.
A Datagro também apontou que a produção de etanol de milho cresce significativamente. Em 2019/20 estava em 1,62 bilhão de litros e estimam-se 5,40 bilhões de litros em 2023/24. Em 2032/33, a produção do biocombustível à base do cereal pode chegar a 14,30 bilhões de litros.
TRADERS AVALIAM CENÁRIO GLOBAL DO AÇÚCAR
Sob moderação de Paulo Garcia, diretor da Vital Commodities, o painel com a visão dos traders para o mercado mundial de açúcar contou com a participação de Jeremy Austin, diretor-geral da Sucden; Rodrigo Ostanello, head de açúcar da ED&F Man; e Michael McDougall, diretor-geral da Paragon Global Markets.
Os palestrantes ressaltaram que o mercado tem compartilhado a percepção de alta para os preços do açúcar, no curto, médio e longo prazos, devido à demanda aquecida. Por outro lado, há preocupação com a falta de perspectiva de expansão do plantio de cana no Brasil, Índia e Tailândia, mesmo em um quadro de preços atrativos. Segundo os especialistas, o mercado também permanece atento às questões de clima, sobretudo na Índia, e logística, que podem impactar os fundamentos de oferta e consumo global.
TECNOLOGIAS PARA MOBILIDADE SUSTENTÁVEL
O tema da palestra de Pablo Di Si, presidente e CEO da Volkswagen na América do Norte, foi a expansão da eletrificação e o potencial para híbridos usando combustíveis líquidos limpos. Na avaliação do executivo, o mercado automotivo permanece forte nos Estados Unidos: no primeiro trimestre deste ano foram vendidas 3,6 milhões de novas unidades, alta de 7,5%. A estimativa é de que sejam comercializados 14,8 milhões de veículos novos até o final do ano, o que representaria crescimento de 7,2%.
Para a concretização desse cenário, contudo, é necessária a recuperação da produção nos Estados Unidos, além da estabilização da cadeia global de suprimentos. De acordo com Pablo Di Si, a Volkswagen tem como meta tornar-se neutra em carbono até 2050.
Em sua exposição, o executivo reafirmou seu posicionamento em favor da mobilidade sustentável, independentemente do modelo de motorização. Segundo ele, o que precisa ser considerado é a pegada de carbono, o processo de descarbonização promovido pela tecnologia, seja ela elétrica pura, híbrida ou biocombustível, e outras que forem surgindo.
EXPANSÃO DO ETANOL NA AMÉRICA DO SUL E CENTRAL
Neste painel, Edgar Herrera, diretor executivo da Liga Agrícola Industrial da Cana-de-Açúcar (Laica) da Costa Rica, abordou a expansão da produção e o uso de etanol na América do Sul e Central.
O palestrante destacou o desenvolvimento de novas alternativas de energia, com cada país investindo no seu potencial, conforme seu pacote de recursos naturais. “Os biocombustíveis, em especial o etanol, são cruciais para o desenvolvimento socioeconômico da região porque promovem segurança e diversificação energética”, disse ele.
Segundo Herrera, o contínuo progresso do setor sucroenergético, em particular na América Central, requer políticas públicas claras, que deem segurança jurídica e atraiam novos investimentos.
EXPANSÃO DO CRÉDITO VIA MECANISMOS DE FINANÇAS VERDES
Especialistas reunidos neste painel elencaram as oportunidades que as modalidades de financiamento verde trazem para diversificação e expansão do crédito, via fontes privadas e mercado de capitais, para o setor sucroenergético e o agronegócio em geral. Entre os principais destaques, o potencial de captação de recursos por meio do mercado de créditos de carbono, green bonds, e também por intermédio da securitização.
O mercado de crédito de carbono permite que empresas, organizações e indivíduos compensem as suas emissões de gases de efeito estufa (GEE) a partir da aquisição de créditos gerados por projetos de redução de emissões e captura de carbono. Exemplo disso é o RenovaBio.
Já a securitização é o termo utilizado para se referir a uma dívida que foi negociada com investidores. Trata-se de uma prática que visa transformar títulos de crédito, como faturas não pagas ou dívidas de empréstimos, em instrumentos negociáveis no mercado de capitais.
Participaram do painel com esta temática a diretora de Investimentos Sênior do Inter-American Development Bank, Monica Navarrete; o head de Debt Capital Markets do Citi Brasil, Alexandre Castanheira; o diretor-geral da Bentley Securities Coporation, Mark W. Gross; e o diretor da Peterson Projects and Solutions, Carlos Mendoza. A diretora da Datagro Financial, Carolina Troster, foi a moderadora.
O POTENCIAL DOS BIOCOMBUSTÍVEIS PARA PRODUÇÃO DE HIDROGÊNIO VERDE
A diretora de Relações Institucionais da Associação Brasileira de Hidrogênio (ABH2), Monica Saraiva Panik, destacou o potencial dos biocombustíveis, em particular o etanol, para a produção de hidrogênio verde e as oportunidades que o cenário atual traz para o agro brasileiro.
Produzido a partir da eletricidade gerada por fontes de energia limpas e renováveis, o hidrogênio verde é considerado a nova fronteira para a jornada global de descarbonização dos setores produtivos e para o cumprimento das metas do Acordo de Paris. Ao longo dos próximos anos, o objetivo é trocar o hidrogênio produzido a partir de fontes fósseis pelo hidrogênio verde, que não emite carbono.
O Brasil está muito bem posicionado para capitalizar negócios nessa agenda, porque é rico em matéria-prima para produção de hidrogênio verde – como o etanol, biomassas de base agrícola e dejetos orgânicos do segmento de proteína animal.
Também participaram do painel o chefe de Desenvolvimento de Negócios da European Energy, Jens Ole Madsen, e o vice-presidente de investimentos do 2W Ecobank, Manoel Antonio Avelino.
CONSUMO DE AÇÚCAR NOS EUA GANHA FÔLEGO COM INDUSTRIALIZADOS
O diretor de Economia e Análise de Políticas da American Sugar Alliance, Rob Johansson, pontuou que a demanda por alimentos industrializados fez o consumo de açúcar na América do Norte, em particular nos Estados Unidos, ganhar novo fôlego, mudando uma tendência de queda observada entre 1970 e 2010.
Segundo ele, a demanda pelo adoçante vem sendo impulsionada pelo crescimento populacional combinado ao maior consumo fora do lar – em hotéis, restaurantes, bares etc. De acordo com Johansson, existe a tendência de certa estabilização no consumo, mas sem grandes possibilidades de recuo.
Também participante do painel, a economista do Departamento de Agricultura dos Estados Unidos (USDA, na sigla em inglês), Vidalina Abadam, apresentou um diagnóstico acerca do trabalho do departamento sobre os dados de balanço de oferta e a demanda de açúcar na América do Norte. Ela destacou, entre outros pontos, o aumento das importações dos Estados Unidos de países de fora do escopo do antigo tratado comercial do Nafta, que englobava México e Canadá.