O Mutum-de-Alagoas e a COP26

Parodiando Luiz Gonzaga, o Mutum-de-Alagoas é a “Asa Branca” do canavial. Tanto quanto o pássaro migrante do Sertão, o da Zona da Mata está voltando. Tido como espécie extinta há quase três décadas, o Mutum bateu asas voou da Mata Atlântica, tangido pela degradação do seu habitat natural. Hoje, em função de uma parceria entre produtores alagoanos de cana-de-açúcar, governo e sociedade civil, o pássaro característico da região voltou ao seu bioma de origem. Vem sobrevoando uma das muitas áreas de preservação ambiental mantidas por usinas sucroenergéticas do estado.

Este retorno foi possível graças à responsabilidade social do agronegócio canavieiro, unindo esforços com os governos da União e de Alagoas, estudos científicos de universidades regionais e mobilização de várias ONGs. Da linha de frente desta iniciativa participou a Usina Utinga Leão, do Grupo EQM. Esta empresa mais do que centenária foi, inclusive, uma das fundadoras do Instituto para a Preservação da Mata Atlântica (IPMA). Antes desta parceria vitoriosa, o Mutum, primeiro espécime extinto da natureza no Brasil, vivia em cativeiro desde o final da década de 1980.

Como resultado de uma ação iniciada em 2017, numa área de preservação ambiental criada pela Usina Utinga Leão, hoje a passarada encontra um refúgio para se reproduzir. Segundo estudos do Museu de Zoologia da Universidade de São Paulo, o Mutum protagonizou, na América Latina, um caso raro de reinserção de uma ave extinta. Um feito apenas comparável ao do falcão-das-ilhas-maurício, do condor-da-califórnia, do corvo-havaiano e do furão-de-pés-negros.

Alagoas tem papel de destaque na criação e manutenção de reservas naturais, incluindo áreas de preservação permanentes e matas ciliares. São 32 usinas produzindo energias renováveis e um dos alimentos de base nutricional mais importantes do mundo, o açúcar. Isso sem derrubar um hectare sequer de mata nativa. Pelo contrário. A cada hectare de cana plantado, os produtores alagoanos agregam mais um terço em áreas de proteção ambiental. Diga-se de passagem, que estes espaços são transferidos para o domínio público, inserindo-se no patrimônio nacional. Temos, atualmente, 300 mil hectares de cana cultivados em Alagoas, com mais 90 mil hectares de preservação aos cuidados dos empresários do setor sucroenergético local. Cabe enfatizar que esta é uma das indústrias que mais empregam no estado, gerando 80 mil empregos diretos. 

Há muitos casos, além do aqui comentado, que marcam, em Alagoas, o comprometimento do segmento canavieiro com a sustentabilidade. O espaço exíguo deste artigo não comporta outras justas citações além da Utinga Leão, mas a história simples, aqui contada, descreve a face humana da indústria sucroenergética. É possível levá-la muito além das páginas efêmeras de jornal. Ela está presente no etanol que enche o tanque do nosso carro, na bioeletricidade que moderniza o País, e no açúcar que adoça a mesa brasileira. Certamente, mesmo não verbalizada, a história do Mutum, inserida no imaginário ambiental, foi na bagagem que levamos a Glasgow, na COP26.

Em artigo recente, o economista Jeffrey Sachs, que agora preside a rede ambiental da ONU, assinala que, de modo geral, os governantes falam muito e agem pouco. Ou seja, ele quis dizer que existe uma ação empresarial concreta em torno deste tema da sustentabilidade, que não é divulgada, defendida ou reconhecida. O Mutum, hoje nosso parceiro, é uma prova disso.

Artigo publicado originalmente no Portal UDOP.